ZÉNITE /2024

 

ZÉNITE acompanha a vida de uma comunidade de seis pessoas, depois de terem sido surpreendidas por uma misteriosa ocorrência: o desaparecimento do telhado da sua casa. Vieram a descobri-lo no mesmo dia, enterrado no pântano junto ao rio. Desde então, começaram a habitar duas metades da mesma casa: uma sem chão, outra sem tecto.

ZÉNITE sucede a ARENA e EQUADOR, encerrando uma trilogia de espetáculos de teatro que encontram no espaço de apresentação o seu ponto de partida. Acontece ao ar livre no vale do Rio Trancão, em três locais distintos: o miradouro, o rio, e a ruína.

Este espetáculo inaugura o Teatro Zénite, uma plateia construída a partir do entulho das obras de requalificação do Teatro Nacional D. Maria II. O projeto é dirigido por Sílvio Vieira, em colaboração com o cenógrafo Rafael dos Santos. Uma produção outro em coprodução com o Teatro Nacional D. Maria II.

27 de Junho a 21 de Julho 2024
às 20h30, no Teatro Zénite

2h | M14

  • Aconselha-se ao público que leve roupa e calçado confortável, um agasalho e repelente, bem como água e uma refeição leve, uma vez que o espetáculo decorre num local isolado, sem oferta de restauração.

    O espetáculo decorre ao ar livre e inclui um percurso pedonal de cerca de 2km, em terreno acidentado e com alguma inclinação. Por esse motivo, não é adequado o acesso a pessoas com mobilidade condicionada.

    Transporte em viatura própria

    Ponto de encontro: Rua Guerra Junqueiro, n.º 1 — Bobadela
    Junto ao posto de bilheteira.´

    > Estacionamento livre, junto ao ponto de encontro, sujeito à disponibilidade

    Transporte D. Maria II

    O D. Maria II disponibiliza transporte gratuito até ao local do espetáculo, mediante pedido no ato de compra do bilhete e sujeito à disponibilidade. O transporte partirá do ponto de encontro às 19h30 e regressará à mesma morada, cerca das 23h45.

    Ponto de encontro: Rua Luís Pastor de Macedo, nº 23 — Lisboa

    > Estação de Metro mais próxima: Quinta das Conchas (saída Rua da Tobis Portuguesa)

direção artística e de projeto Sílvio Vieira
produção executiva Daniela Leitão

conceção do Teatro Zénite Rafael dos Santos e Sílvio Vieira
chefe de manutenção e construção Tiago Pedro
consultoria de segurança Fernando Rodrigues

cocriação e interpretação Catarina Rabaça, Gaya de Medeiros, Márcia Cardoso, Miguel Galamba, Rita Cabaço e Tadeu Faustino
texto Sílvio Vieira, com excertos do elenco e depoimentos de sobreviventes de Hiroshima e Nagasaki
cenografia e desenhos Rafael dos Santos
assistência à cenografia Catarina Sousa
figurinos Marine Sigaut
desenho de luz Pedro Guimarães
desenho de som Kino Sousa
voz Anabela Ribeiro
maquilhagem Sara Marques de Oliveira
teaser Carlos Conceição
registo António Mendes
fotografia Bruno Simão, Filipe Ferreira e João Cachola

produção outro
coprodução Teatro Nacional D. Maria II
residências artísticas DeVIR CAPa (Faro) e UMCOLETIVO (Portalegre)
parceiros República Portuguesa | Cultura, Casa Santos Lima, União de Freguesias de Santa Iria de Azóia, São João da Talha e Bobadela, Câmara Municipal de Loures, Câmara Municipal de Lisboa, Mirabilis Films, Ser+ Associação Portuguesa para a Prevenção e Desafio à Sida, e Coffeepaste

agradecimentos Agostinho Santos, Ângela Rocha, Carlos Pereira, Dona Inocência, João Calixto, Machado Pinheiro, Mariana Sá Nogueira, Mestre André, Miguel Ponte, Manuel Vicente, Pedro Sarmento, Rodolfo Vicente, Rute Reis, Sancha Viana, Stéphane Alberto, Artistas Unidos, Centro Cultural de Belém, LARGO Residências, Quinta da Boiça (Luís Coutinho), Polo Cultural Gaivotas | Boavista

ZÉNITE integra o Ciclo Abril Abriu, uma iniciativa do Teatro Nacional D. Maria II, e foi sonhado e concretizado com o especial apoio da Casa Santos Lima.

NOTA de intenções

Depois de ARENA, um espetáculo de teatro sem palavra que estreou no final de 2021 numa antiga oficina de automóveis em Lisboa, fez sentido repensar os dois projetos seguintes à luz da problemática e estética levantadas com esse espetáculo. O facto de ARENA ter aberto a porta à apresentação do trabalho seguinte numa sala de teatro convencional (no Centro Cultural de Belém), constituiu um problema existencial à ruptura que procurámos com aquela garagem em relação aos modos contemporâneos de produção e difusão de espetáculos.

Depois de criarmos aquele espaço efémero, fundando (pelo menos, para nós) novas formas de entrelaçar a profissão e a vida, o convite de um programador para estrear EQUADOR no CCB surgiu como presente temporário a um grupo de artistas de teatro sem Teatro. Aceitámos o convite, embora sabendo que o problema subsiste: muitos artistas não têm espaço para trabalhar, como muitos jovens (agora adultos) não têm uma casa a que possam chamar sua.

Este problema concreto, articulado com a vontade artística de trabalhar os lugares e não apenas em lugares, deu origem a uma possível trilogia* do espaço:

ARENA
EQUADOR
ZÉNITE

*ARENA estreou em Novembro de 2021 na antiga Garagem do Chile. EQUADOR foi apresentado de 7 a 14 de Julho de 2023 na Blackbox do Centro Cultural de Belém.

 
 

TEATRO ZÉNITE: ERGUIDO DA PELE DO TNDM II

O espetáculo ZÉNITE acontece no Teatro Zénite, uma plateia construída a partir do entulho das obras de requalificação do Teatro Nacional D. Maria II. A ideia traduziu-se na construção manual de um conjunto de 35 blocos de cimento e entulho, capazes de sentar 70 pessoas. Desenhados para uma utilização ao ar livre, podem ser transportados para outros locais e dispostos em diversas configurações. O Teatro Zénite não se fixa, portanto, a um só sítio: existe onde quer que esteja a sua plateia.

O nascimento deste Teatro a partir do entulho histórico do TNDMII é, ao mesmo tempo, um gesto concreto e simbólico, arqueológico e voltado para o futuro. Este projeto continuará (assim o desejamos) com a apresentação de candidatura à DGARTES para o seu primeiro ciclo de programação, em 2025, com foco na criação experimental e emergente.

O ESPETÁCULO

ZÉNITE dialoga construtivamente com o problema da escassez de espaço, ao mesmo tempo que aprofunda os limites da proposta artística de criação no, do, e para o espaço. O significado da palavra “zénite” sugere verticalidade e céu, ambos familiares à ideia de sagrado. O espetáculo será um retorno à natureza e à ação humana e ritualística da sua contemplação por um coletivo em assembleia — o mesmo gesto vertical e religioso que estará na origem da arte.

 

FOLHA DE SALA

Há uns dias a Daniela contou-me que teve uma conversa com os nossos vizinhos. Eles diziam: não importa o que façamos aqui, volta sempre tudo ao mesmo. Nós fomos percebendo isto com o tempo, não sem uma boa dose de desespero. Este lugar é pouco amigo de visitas. Uma sequência de acontecimentos menos felizes fizeram-me acreditar pela primeira vez no mau olhado, e ainda segui as sugestões pagãs da equipa, de tomar banhos de sal com ervas. Pedi à minha mãe para pôr velas à nossa senhora. E depois lembrei-me de uma das lições que tirei das aulas de Aikido do meu pai, que tive em criança: usar a energia de um oponente a nosso favor, reconduzindo-a. Não houve outra forma. Foi isso que tivemos de fazer aqui, todos nós, a cada novo problema, porque “lutar contra este corpo”, como escrevo a dada altura no texto, “é sair derrotado”.

Falhámos várias vezes, e o espetáculo continua cheio de imperfeições. Também isso foi uma aprendizagem: por grande que seja o investimento humano e financeiro, o artista deve reservar-se o direito de falhar. E se há coisa que senti nas semanas que antecederam a estreia, é que nunca estive tão perto do redondo falhanço, do colapso das ideias. A responsabilidade seria sempre minha, embora, também pela primeira vez, tenha sentido que a maquinaria estava fora do meu controlo, forçando-me a confiar nesta equipa, e a largar. Os espetáculos são sempre a medida das possibilidades de quem os faz. Mas isso não quer dizer que o alvo tenha de ser apenas o possível (ou as utopias seriam inúteis).

Escolhemos sempre ideias impossíveis para concretizar o nosso compromisso último com a beleza. É um objeto artístico antes de qualquer outra coisa, este ZÉNITE, e a forma como abordámos o impossível foi sempre a mesma: aproximar-nos dele o mais que conseguirmos, e deixar morrer o que fosse preciso, na altura certa. Atrás de nós há um cemitério de ideias por cumprir.

Estreámos hoje, uma semana depois da data prevista. Há agradecimentos que não posso deixar de fazer. No dia 27/6 escrevi umas palavras para as mais de 70 pessoas que nos ajudaram a pôr isto de pé, e espero que vos tenham feito chegar esses envelopes porque inclusive trazem brinde. Em primeiro lugar à minha equipa: a todo o elenco, em especial à Rabaça e ao Galamba, guerreiros que estão comigo desde o início desta trilogia e que já passaram por todas as provações; à equipa artística, em especial ao Rafael dos Santos, que foi o meu cúmplice durante praticamente todos os momentos do ZÉNITE, começando pelas viagens de mota a ver espaços em Lisboa, até encontrarmos este e não querermos outro; e ainda à Daniela, a melhor produtora que alguma vez conheci, e que se apaixonou por este projeto numa tal medida que foi ela quem segurou tudo sempre que eu não consegui.

E ainda, duas pessoas muito importantes: a Catarina Sousa, que colaborou connosco na cenografia, e o herói Tiago Pedro, profissional raro que encontrámos na internet para fazer a limpeza da ruína (que tinha silvas três metros acima das nossas cabeças, e toneladas de entulho). Foi ele que tratou de tudo, a maior parte do tempo sozinho. O Tiago também se apaixonou pelo projeto mas, como bom português, ainda demorou a admiti-lo: ficou connosco até ao fim e foi ele que construiu o bonito telhado que o Rafael desenhou, junto ao rio. Considero esta grupeta de cinco o núcleo inquebrável do ZÉNITE: o Rafa, a Catarina, a Dani, eu e o Tiago, que todos os dias, inclusive hoje, vão para o lodo puxar o barco para terra. Será um acontecimento cósmico encontrar uma equipa que se compromete seriamente com a sua arte, ao mesmo tempo que se ri à gargalhada, de pernas enterradas no lodo, carregando consigo um barco pelo rio, depois da meia noite e só com a luz da lua?

Eu acho que sim. Esta é talvez a imagem mais nítida que levarei deste projeto. Foi o lodo que nos uniu. Agradeço ao lodo. Aproveito ainda para agradecer com todo o coração à nossa incrível vizinhança, que nos lembrou que este projeto também é sobre pessoas, sobre afetos desinteressados, sobre relações humanas que nada têm a ver com trocas comerciais: ao Rodolfo e ao Manuel Vicente, e também ao Senhor Adérito e ao Senhor Cunha. Sentimo-nos bem-vindos desde o primeiro momento e só tenho a agradecer, em nome de toda a equipa. Gostaria ainda de agradecer aos nossos parceiros mais importantes: primeiro ao Teatro Nacional D. Maria II, cujo apoio foi absolutamente essencial, à confiança que o Pedro Penim depositou em nós, e ainda a todas as equipas: manutenção, direção artística, produção, direção de cena, técnica, maquinaria, comunicação, frente de casa e bilheteira. Sei que este projeto também vos desafiou muito enquanto estrutura, e por isso quero agradecer-vos todo o investimento e todas as soluções que fomos encontrando em conjunto ao longo do caminho.

Em segundo lugar, agradecer ao Nuno Leitão, presidente da junta UFSSB, pessoa que definiu para mim o que um excelente político pode ser. Incansável na movimentação de todos os meios locais, fundamentais para que o espetáculo se realize. Por fim, um agradecimento muito especial à Casa Santos Lima, empresa proprietária do magnífico terreno onde nos encontramos, na pessoa do seu dono José Luís Santos Lima, que com a maior gentileza nos cedeu este espaço e sem o qual nada disto aconteceria.

Estreámos hoje, uma semana após o previsto. Estreámos hoje com toda a carreira do espetáculo já praticamente esgotada. Também ARENA e EQUADOR esgotaram as suas carreiras. O nosso trabalho tem vindo a ser “apreciado” por um número crescente de pessoas, mas a sua natureza faz com que seja difícil de replicar ou levar a outros sítios que não estes onde se apresenta. Dentro de quatro dias termina o prazo de candidatura aos apoios sustentados da DGARTES. Um apoio que possibilitaria a esta estrutura um plano de atividades contínuo, e uma retribuição mais justa e estável para as suas equipas. É uma candidatura exigente e que exige das estruturas veteranas meses de preparação. No nosso caso, teríamos de fazê-la em uma semana.

Por falta de tempo, e também por estarem na reserva os recursos mentais e emocionais das duas pessoas que fariam esse trabalho (eu e a Daniela), tomei a decisão difícil de não concorrer. Isto significa que a continuidade do nosso trabalho e a continuidade do Teatro Zénite — que existe enquanto existirem aqueles 35 blocos de cimento (que poderão vir a ser mais, porque temos entulho guardado) — dependerá de outras linhas de financiamento pontuais, boa vontade de coprodutores, e de mecenas (estou a piscar o olho a várias pessoas na plateia).

Por fim, dizer que na sala ao lado, temos um beberete montado com direito à degustação do vinho da Casa Santos Lima. Que é só a cereja no topo do bolo.

Obrigado a tod_s. E venha a reposição <3.

Sílvio, 6 Julho 2024

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